Em 26 de julho, tentei me hospedar no hotel Íbis Santos Dumont, no Rio, com minha filha de 12 anos, uma amiga dela de 11 anos e minha atual esposa, então grávida de seis meses. Apresentei minha identidade mais a certidão de nascimento de minha filha, mas a gerente não permitiu que ela se hospedasse porque eu não tinha a autorização por escrito da mãe. As recepcionistas disseram que estavam ocorrendo casos de pedofilia e rapto de menores. Foi um constrangimento para mim ouvir isso na frente da minha família e de outros hóspedes. O curioso foi que a amiga da minha filha, que tinha uma permissão para viajar assinada apenas pela mãe, foi aceita. Fui, então, ao Tribunal de Justiça, no centro do Rio, onde o juiz de plantão emitiu uma ordem que obrigava o Íbis a aceitá-la. Esperamos três horas plantados no saguão por essa decisão. Só quando o oficial de justiça foi ao hotel é que minha filha pôde se hospedar.
No caso narrado por Wedson, estão em jogo duas situações: a interpretação de uma lei e de uma nota técnica que não chega a ser lei. A primeira delas é o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), uma lei que proíbe a hospedagem de menores em hotéis e congêneres, exceto se autorizado ou acompanhado pelos pais ou responsável. A outra é um esclarecimento emitido pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), que diz que a hospedagem de menores acompanhados de um dos pais somente poderá ocorrer mediante autorização do pai ausente ou judicial – foi esse o texto usado pela Accor para justificar a proibição de hospedar a filha de Wedson.
O caso não é simples. Por um lado, houve excesso de zelo por parte do hotel ao proibir a filha de Wedson de se hospedar, pois a menina nunca esteve desacompanhada. “ Fui equivocada a interpretação do hotel, já que o próprio ECA define que não há necessidade de o menor ter autorização para viajar no Brasil desde que esteja acompanhado por um dos pais”, explica a advogada Luciana Atheniense. Ela também se mostrou surpresa pelo fato de o hotel ter aceitado hospedar a menina de 11 anos, amiga da filha de Wedson, que viajava com uma autorização assinada somente pela mãe.
Por outro lado, a redação dos artigos 82 e 250 do ECA é confusa: os textos falam da necessidade de acompanhamento ou autorização “ pelos pais” e não enfatiza “ por um dos pais” ou “ambos os pais “, coisa que o mesmo ECA faz em outro artigo, o 84, quando determina que, se o menor for viajar para o exterior acompanhado só pela mãe, é preciso uma autorização expressa do pai, com firma reconhecida.
A interpretação da lei confunde as redes hoteleiras consultadas pela VT. Os grupos Hyatt e Pestana solicitam, no check-in, documentos que comprovem a filiação do menor. A Accor, a Blue Tree e a Atlântica exigem declaração do pai que estiver ausente, com firma reconhecida. O assessor de gabinete do Conanda, Helio Castro, disse à VT que solicitou ao Conselho Nacional de justiça uma manifestação acerca da interpretação dos artigos 82 e 250.
Até lá, para evitar a mesma dor de cabeça que Wedson teve, é melhor viajar com uma autorização do pai que estiver ausente.