Um em cada dois brasileiros flagrados com “muamba” pela Receita Federal no aeroporto internacional de Cumbica, em Guarulhos (Grande São Paulo), chega dos EUA. Os dados, inéditos, foram obtidos pela Folha com base na Lei de Acesso à Informação e, em seguida, complementados pela Receita. Todos são casos de passageiros parados pela alfândega ao tentar entrar no país sem declarar compras no exterior acima da cota permitida.
Há dois tipos de cota: a de valor (US$ 500) e a de quantidade (que varia de acordo com a mercadoria; para bebidas, por exemplo, o limite é de 24 unidades, sendo que só 12 devem ser do mesmo tipo). Na maioria dos casos, quem excede a cota paga multa e imposto para levar o produto para casa. Se extrapolar o limite quantitativo, não tiver dinheiro para pagar imposto ou trouxer mercadorias piratas, o produto é apreendido e levado a leilão.
MULTA
Entre os barrados está a representante comercial Glória (nome fictício), 31, que chegou de Orlando em outubro com US$ 8.000 (R$ 16,1 mil) em três malas lotadas de roupas de adultos e de bebê. Ao ser flagrada na Receita, disse que tinha “apenas” US$ 2.000 em produtos, chorou (literalmente) e saiu após pagar R$ 3.000 em multa. “Ainda assim, valeu a pena”, diz ela, que vende os produtos pelo dobro do preço na internet. Tanto que Glória agora planeja voltar em fevereiro a Orlando; só que, por estratégia, ela escolheu um voo de volta que chegará de madrugada, pois ouviu dizer que nesse horário a fiscalização é menor -o que auditores negam. Tentar disfarçar é estratégia comum entre os sonegadores, segundo os próprios viajantes.
Entre as mais comuns está fazer hora no free shop, para esperar todos do voo saírem primeiro ou ir atrás de alguém com mais malas. Glória disse que fará assim. Julia (nome também fictício), 27, estagiária de direito, recorreu à mesma estratégia ao chegar de Miami com US$ 5.000 em eletrônicos e roupas. Passou sem ser pega. OS
NÚMEROS
De janeiro a setembro de 2012, 13.242 passageiros foram parados na alfândega do aeroporto, 6.977 dos quais (53%) em voos americanos. Peru (onde são feitas as camisas da marca Lacoste) e China (produtos falsificados) também estão entre os países com passageiros flagrados. A Europa passa quase batida, embora tenha quase tantos voos internacionais (19%) em Cumbica quanto os EUA (20%; os dados são de 2012).
Uma das explicações é que, nos EUA, os produtos, especialmente eletrônicos e artigos infantis, são mais baratos que na Europa. Viajar para os EUA também sai mais em conta. Por trás disso está principalmente o fato de o euro ser mais caro que o dólar. Apesar dos números, a Receita diz não haver uma única prioridade no trabalho de seleção. “Todos os voos sofrem fiscalização, em menor ou maior grau, alternadamente, ao longo dos dias”, diz o auditor André Martins, chefe do setor de bagagens da Receita em Cumbica.
Os voos dos EUA são vistoriados com foco em determinadas características, mas há interesse em flagrar irregularidades em voos de outras origens -por exemplo, drogas sintéticas vindas da Europa. A Receita não revelou suas estratégias de fiscalização. Disse que escolhe os passageiros de modo aleatório. O sindicato dos auditores defende que 10% dos passageiros sejam fiscalizados. Hoje, não há um mínimo estipulado. O valor obtido com as mercadorias apreendidas ou com multas não foi divulgado.
Fonte: BOL/UOL